Educação Infantil inspira avaliação formativa

Entrevista > Antoni Zabala

Educação Infantil inspira avaliação formativa

Para o educador espanhol, as técnicas para ensinar crianças pequenas deveriam ser conhecidas de todos os professores

            Monitorar os alunos que trabalham em grupos, observar suas reações e evoluções durante a aprendizagem e fazer relatórios de desenvolvimento são alguns dos caminhos para ser fazer uma avaliação formativa. Essa é a opinião de Antoni Zabala, educador espanhol que esteve no Brasil em setembro, e deu a seguinte entrevista para NOVA ESCOLA.

Nova Escola > Qual a principal dificuldade que o professor enfrenta no processo de avaliação?
Zabala < A maior barreira é interna. Ele precisa se desfazer de toda sua história como aluno e como professor. As propostas mundiais sobre o que deve ser o ensino implicam em mudança total, que afetam aquilo que é nuclear: a avaliação. Eu diria: diga-me como avalia que eu te direi que professor você é. É na maneira de avaliar que aparece tudo o que é importante para o professor. Se avaliamos somente os conceitos matemáticos, químicos ou a gramática não estamos mudando nada. Só estou dando a entender que quero formar futuros universitários. Na verdade, os professores deveriam tentar introduzir também seu pensamento de educador. Isso implica em falar de valores, de estratégias de aprendizagem, de colocar técnicas de trabalho em equipe e itens que avaliem o que se considera o perfil ideal da pessoa que se quer aprovar.

NE > Aconteceram várias mudanças nos conceitos do que seja a educação ideal, nos últimos 40 anos. O professor consegue captar rapidamente esses novos parâmetros?
Zabala < A sociedade é bastante farisaica em relação à educação. Todos dão importância à ela, dizem que é aí que está o futuro do país, que é fundamental, básica etc. Mas um caminho se constrói andando, com ações. Em quase todos os países a educação tem sido meras palavras. O que realmente importa é a valorização profissional da educação. Mas isso é deixado de lado. Em uma sociedade como a nossa, esse valor se dá em retribuições salariais e no valor econômico e social atribuído ao profissional. A formação que os professores tiveram não foi suficiente, mas as motivações para que as mudanças ocorressem foram mais do que insuficientes.

NE > Classes grandes e superlotadas prejudicam a concretização de um modelo ideal de avaliação?
Zabala < Existe um problema anterior. Todo pensamento precisa de estímulos para mudar. O professor precisa capacitar-se, mas não é suficiente. É apenas um caminho. Os pensadores da educação defendem modelos impecáveis. Esse é o discurso. É muito fácil fazer leis que atendam esses princípios. O problema está em colocar os meios que levem essas idéias a cabo. É preciso aprender técnicas, estratégias e formas profissionais de se atuar em relação a esses preceitos. Isso implica em um processo de aprendizagem: precisa ter um professor, informações básicas, alguma experimentação... E aí não acontecem ações suficientes. Dizemos que avaliar de forma personalizada com 30 ou 40 alunos é difícil. Mas pode ser feito, se conhecermos as técnicas e as estratégias para isso.

NE > Quais seriam esses instrumentos e técnicas?
Zabala < Atender a uma avaliação formativa, respeitando as características de cada aluno, não é uma questão de tudo ou nada. Pode ser feita aos poucos ou em parte. Sabemos que o ideal teórico é uma utopia. Dificilmente conseguiremos que uma escola possa atender a todos os alunos segundo suas necessidades e possibilidades. Existem muitas estratégias, porque uma das coisas que nós professores mais temos é criatividade para inventar atividades. Não é preciso consultar teóricos. Essas estratégias estão aqui mesmo no Brasil, em muitas escolas de qualidade que estão atendendo a diversidade. O segredo está na participação dos alunos nos processos de ensino. Os alunos devem ajudar outros alunos, ser considerados agentes educadores dos companheiros. Todas as grandes experiências que existem no mundo de atenção à diversidade não implicam em redução das classes. O papel do professor é provocar ajudas, dinamizar a classe para que se trabalhe em pequenos grupos flexíveis, às vezes em pares. O que sabe mais ajuda o que sabe menos. As técnicas passam por montar classes dinâmicas, onde existam relações interativas que provoquem conhecimento. Isso implica uma mudança no papel do professor. O professor não é aquele que tem o conhecimento e o transmite. O professor é aquele que veicula interações, provoca intercâmbio na aula e ajuda na busca de conhecimentos.

NE > Os próprios alunos serão então companheiros de ensino e aprendizagem?
Zabala < As técnicas para atender a diversidade estão na Educação Infantil. O que fazem as crianças lá? Ficam sentadas umas atrás das outras, escutando o mestre? Não, elas fazem coisas. E não fazem sozinhas. Estão sempre com os colegas, em pares ou trios. Um olha o outro e aprende com ele. Devemos usar essa estratégia. A professora não transmite conhecimento, ela ajuda a todos, cobrando tarefas e querendo saber por que motivo não as executaram, quais as dificuldades. O modelo de avaliação também está lá. Os professores não sancionam seus alunos, dizendo que não sabem isso ou aquilo. Eles tentam averiguar o que eles não sabem para orientá-los. As crianças são mais espontâneas e desarmadas. Contam o que sabem e o que não sabem fazer. Ao passo que quando são maiores, ninguém se atreve a ir ao mestre e dizer "eu não sei fazer isso". Porque temem que ele imediatamente anote essa "falha" do aluno. Está claro que devemos ir de um modelo seletivo para um modelo orientador, centrado no que o aluno sabe e não naquilo que ele não sabe; na sua capacidade e potencialidade. A ação do mestre deve ser buscar o que o aluno tem de melhor e tentar valorizá-lo. A função da escola não é preparar para a universidade, é preparar para a vida. E a vida tem quem vai ser matemático, mas também tem cozinheiros, camareiros, motoristas. Tem de haver de tudo. E esse motorista tem de ser o melhor possível, o arquiteto tem de ser o melhor possível. Isso implica em buscar aquilo em que o aluno é mais potente. A função do professor é conhecer o aluno, valorizá-lo para despertar seu interesse em buscar o conhecimento. Buscar ele próprio, não impor-lhe o conhecimento. Muitas vezes utilizamos as notas para controlar a disciplina do aluno e para obrigá-lo a estudar. Mas por que devemos fazer alguém estudar algo que não lhe interessa? Quando não há interesse não há aprendizagem.

NE > Em quais casos a retenção é necessária?
Zabala < Esse problema está aparecendo em todos os países. O dilema é: os alunos devem ser promovidos automaticamente? Depende do jogo que estamos jogando. Se o modelo que temos é aquele em que a escola deve preparar para a universidade, então o modelo seletivo deve prevalecer, assim como todas as regras que ele implica. Se nos convencemos que o objetivo da escola é formar pessoas que se integrem à sociedade e dê respostas aos problemas que a vida vai lhes trazer, então as normas devem mudar. O problema é que edita-se uma portaria para que as orientações de um modelo sejam aplicadas em outro. Ou se muda tudo, ou é melhor não mexer. Se queremos formar pessoas equilibradas e autônomas, elas devem ter uma boa auto-estima. Estamos ajudando a fomentar a auto-estima quando obrigamos uma pessoa a deixar seu grupo de amigos e a freqüentar uma turma mais jovem? Isso é bom para seu equilíbrio? Está claro que não. Para ela é uma humilhação repetir de ano. Ora, mas se no curso seguinte não existe um modelo de ensino que atenda a diversidade, esse aluno não vai acompanhar a classe. Portanto, é melhor que repita. Mas, cuidado! Isso acontece por um déficit do sistema, que não preparou esses professores para atender a diversidade. Mas se eles sabem atender a diversidade, então não deve haver retenção.

NE > Que conselho o senhor daria para o professor que estará nesse mês de dezembro fazendo o planejamento escolar para o próximo ano quando estarão querendo mudar o seu modo de avaliar?
Zabala < Se ele está tentado, quero felicitá-lo: está no caminho. Existem na maioria das escolas as técnicas e estratégias necessárias para responder a essas dúvidas. É preciso estar alerta e escutar os demais. Escutar e refletir com os companheiros.




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