História do Dinheiro - Idade do Dinheiro

A Idade do Dinheiro

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Vivemos numa sociedade crescente materialista e consumista, onde o alto bem-estar atingido em parte considerável do globo tem sido atribuído ao sucesso da sociedade de mercado, regida pelo capitalismo turbinado que percorre o planeta como um cometa celestial anunciando, aqui e ali, simultaneamente, prosperidade e mau tempo, fruto da sua própria e natural inconstância. Um cometa que acima de tudo anuncia o estabelecimento definitivo da Idade do Dinheiro.

A mercantilização de tudo

"Ouro, precioso ouro, amarelo e brilhante! 
Um pouco dele fará dos pretos, brancos; 
dos tolos sábios; Do mal, bem, do vil ,nobre 
do velho, jovem, do covarde, valente..."

Shakespeare - Timão de Atenas

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Tesouro antigo
A importância de um filme é medida antes de tudo o mais pelo custo da sua produção e pelo volume de sonante gerado nas bilheterias. O sucesso de um indivíduo com talento artístico ou no campo dos esportes é balizado pelos patrocínios publicitários que ele recebe e pelos contratos comerciais que assina. Os times esportivos mais competitivos dos dias de hoje ostentam em sua camisetas seus financiadores e mesmo gente comum se presta voluntariamente para servir de anuncio vivo, carregando marcas ou slogans de conhecidas e famosas empresas impressos em camisas ou blusões. Tornam-se, gratuitamente, cartazes e pôsteres ambulantes.

As artes plásticas, atoladas num hermetismo cada vez mais abstrato e incompreensível, subsistem hoje apenas como linha auxiliar da propaganda e da arte de vender , escondida atrás da palavra merchandising , parece ter superado todo e qualquer outro tipo de engenho humano inventado antes. Enquanto isso os clássicos da pintura e da escultura têm sua dimensão estabelecida pelo alto preço com que são arrematados nos leilões: um Rembrandt , um Van Gogh ou um Rodin são respeitados porque valem milhões. Nas televisões e nos rádios, a hora do especulador, com intermináveis cotações das bolsas de valores, com seus sobes e baixas, tem lugar garantido em todos os noticiosos. Definitivamente o mundo todo virou um imenso bazar. Absolutamente tudo hoje é mercadoria, o dinheiro é a única medição das coisas humanas e das inanimadas.


O deus é Mammon

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Mammon, folhado a ouro
Se algum dia alguém der prosseguimento naquela conhecida classificação que dividia a evolução da humanidade em Idade do Bronze, Idade do Ferro, terá que convir que definitivamente vivemos na Idade do Dinheiro, tendo Mammon, o deus pagão da riqueza, como sua divindade inconfessa. Cabe aos intelectuais de agora reconhecer o fracasso, seu e de todos aqueles que os antecederam.

Sim porque durante séculos mobilizaram-se, em tempos diversos, para denunciar os perigos do mundo mercantilizado, onde tudo corria ao som do tilintar das moedas. Entre os clássicos, Aristóteles por exemplo , na sua classificação das formas de viver exposta na Ética de Nicômaco, nega-se a considerar o negócio como uma atividade digna do ser humano e que o que a tal se dedicava "é um homem que está fora da natureza".

Não foi diferente entre os grande nomes da patrística e da teologia cristã, como São João Crisóstomo, Santo Agostinho ou São Tomás de Aquino que viam na usura, "a ganância sem causa", praticada pelos mercadores, uma atividade vil, tanto que é que Jesus expulsou do templo tal tipo de gente. Somente justificada se fosse acompanhada por um ato de caridade, porque o comércio, seja ele qual for, "encerra certa torpeza".

Sem Palácios de Cristal

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Adorando o bezerro de ouro, a única cerimônia universal da humanidade (Tela de N.Poussin)
Quem não imprecou contra o poder do dinheiro, quem não lançou pragas e maldições contra o pérfido metal? Os anarquistas do século passado ,os militantes socialistas e os pensadores marxistas, foram talvez a última e inútil insurgência contra o total predomínio do mundo argentário.

Porém o comportamento da humanidade decepcionou a todos eles. Ao contrário dos que planejavam para ela Palácios de Cristal, mundo perfeitos onde a miséria seria desconhecida, ela mostrou-se apenas singelamente interessada no seu bem-estar material mais rasteiro, sendo que entendeu que a melhor forma de alcançá-lo era exatamente pela exacerbação das relações mercantis, em transformar tudo num imenso armazém, em deixar-se arrastar pela simples lógica do dinheiro.

O choque maior para os intelectuais contestadores e para os teólogos inconformados de hoje é de que percebem que o crescente mercantilismo não tornou o homem sorumbático ou depressivo, como imaginavam que fatalmente iria ocorrer. Facilmente verifica-se em qualquer lugar que as pessoas orgulham-se e sentem-se até honradas em se verem consideradas como uma mercadoria, em venderem, caso sejam famosas, a sua imagem para um anúncio publicitário qualquer . Nem mesmo por isso consideram-se aviltados ! Ao contrário, ficam felicíssimos em serem considerados alvo desse tipo de atenção e da popularidade daí decorrente. Isto demonstra o enorme equivoco, a imensa alienação, que as melhores cabeças de todos os tempos incorreram ao avaliar incorretamente os sentimentos gerais da maioria das pessoas em relação às coisas materiais e aos bens que pretendiam ter.

As três barreiras contra o negócio

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Cristo expulsando os mercadores do templo

Diga-se que a triunfante visão negocista que ora manifesta-se soberana pelo mundo inteiro, teve que enfrentar, ao longo dos tempos, três grandes barreiras culturais e mentais que se lhe antepuseram: a da filosofia clássica com seu preconceito contra o Negócio; a da teologia cristã e seus anátemas contra a Usura; e o da doutrina marxista condenado o Capital. Porém, com o tempo e com pertinácia, venceu a todas elas, superando ou removendo os entraves da filosofia, da religião e da ideologia.

E, talvez, a razão da sua vitória deve-se a que a percepção mercantilista das coisas, a maneira de ver o mundo pelos cifrões e pela contabilidade de lucros e perdas, é que nunca atribuiu aos homens valores superiores, transcendentais. Nunca os viu com olhos de fantasia, nem depositou neles grandes expectativas. Sempre os enxergou como realmente são: um amontoado de pobres diabos carentes de tudo, movidos pelas coisas comezinhas, rasteiras e sem sabores que os cerca e que ficam imensamente gratos em poder consumir qualquer coisa, em exibirem-se frente aos outros com as coisas de compraram, substituído sem grande remordimentos o shopping center ou a loja de departamentos pela igreja ou pelo encontro político-partidário. Nunca os ideólogos do mercado creditaram-lhe, ao homem comum, ao homem-massa, qualquer grande destino redentor ou façanha ideal transformadora do mundo. Nem mesmo acalentaram nele a esperança na imortalidade, alcançada possivelmente depois que as prestações assumidas estivessem quitadas. Como igualmente nunca imaginaram-no capaz de viver numa sociedade harmônica e solidaria, porque nela, provavelmente, morreriam de fastio e tédio.


Autoria : Voltaire Schilling

Fonte : http://educaterra.terra.com.br/voltaire/index_artigos.htm

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